20091205

Contacto. Mácula. Imaculada. Concepção.(II)

.









O termo contacto não tem contornos definidos, porque o contacto entre os corpos tanto pode ser de ordem sexual como não. O contacto entre corações tanto pode ser de ordem sexual como não o ser. O contacto entre os afectos tanto pode ser de ordem sexual como não o ser. O Contacto transborda do sexo - é por isso que não há uma 'ciência do contacto'; é por isso que o termo contacto é demasiado subjectivo para ser um termo cientifico

Não sei bem do que é que estou a falar quando falo de contacto; os contornos não estão bem definidos; os limites são impossíveis de assinalar. Mas, se estou ao nível da metafísica, da possibilidade de pensar para além dos limites da natureza, não será necessário que os limites sejam impossíveis de assinalar?

[...]

Se falar em sexo oral, anal, genital, ou qualquer outro tipo de sexo, já todos sabemos do que estou a falar. É a delimitação objectivante do discurso ciêntifico. Todos sabemos do que estou a falar porque o sexo é uma coisa física, ao passo que o contacto pode transbordar da fisicalidade. O contacto é metafísico. Como afirma Merleau-Ponty em Phenomenologie de la Perception:

É necessário sem dúvida alguma reconhecer que o pudor, o desejo, o amor em geral, tem uma significação metafísica, isto é, são incompreensíveis se tratarmos o homem como uma máquina governada por leis naturais, ou mesmo como um "feixe de instintos".









O contacto põe-nos no regime da proximidade, da intimidade; faz-nos devir seres fusionais. O contacto é uma coisa 'louca' e brutal, mágica e enfeitiçadora. O que pretendo neste trabalho é reabilitar o contacto, restabelecer o contacto, a confusão, a fusão. Reabilitar o contacto significará em simultâneo, fazer mergulhar o pensamento na problemática do contacto e, aceder ao encanto da problemática, da dinâmica do contacto, da carnalidade. Porque o meu projecto de reabilitação do contacto funda-se num outro projecto de fundo: a abertura para a sensualidade do contacto; a abertura para um corpo, uma carne que fala a linguagem fascinante da sensualidade; a linguagem primitiva dos ritmos do corpo.

[...]

o meu pensamento está fascinado pela ideia de contacto, dos corpos que se tocam e se cheiram e se procuram. O outro é sempre o princípio do contacto e como afirma Jankélévitch em Le Pur et L'impur "a ingerência do outro é o princípio da mancha por excelência". É uma problemática que se inscreve no princípio da ideia de perdição. ***



























Esta Divina prisión del amor en que yo vivo, ha hecho a Dios mi cabtivo y libre my corazón. Y causa en mí tal pasión ver a Dios mi prisionero,
que muero porque no muero.
Ay qué larga es esta vida! qué duros estos destierros! esta carcel, estos hierros, en que el alma está metida! Sólo esperar la salida me causa dolor tan fiero,
que muero porque no muero.

****


















the method we speak of alone permits us to go beyond ..., to affirm the existence of objects inferior and superior (though in a certain sense interior) to us, to make them coexist togheter
[...]

As I probe more deeply into its essence, this unity will appear to me as some immobile substractum of that which is moving, as some intemporal essence of time; it is this that I shall call eternity; an eternity of death [...]

It is quite otherwise if we place ourselves from the first, by an effort of intuition, in the concrete flow of duration..., far from leaving us suspended in the void as pure analysis would do, brings us into contact with a whole continuity which we must try to follow, whether downwards or upwards;
in both cases we extend ourselves indefinitely by an increasing violent effort, in both cases we transcend ourselves. [...]

No longer conceptual eternity, which is an eternity of death, but an eternity of life. A living and therefore still moving eternity in which our own particular duration would be included as the vibrations are in light; an eternity which would be the concentration of all durations.

Between these two extreme limits intuition moves, and this movement is the very essence of metaphysics
**






































ouvi o teu cheiro no silêncio, numa catedral de medo quente, profanada pelo sangue que os mortos santificam. respirei os últimos suspiros da tua sinfonia, o teu amor rasgou-me os dedos, nessa noite solarenga as pregas do teu ventre sugavam aves , bandos de homens, as tuas raízes perfuravam camadas infinitas de livros e fogueiras. nadei-te sombra, beijaste-me os joelhos, antes dos alfabetos. sou aquele que não desiste de nascer de novo.
um dia, acabada de forjar a armadura de vitrais, levarei palavras em aquários para dar de beber ao teu útero violentado pela métrica dos impérios.
quando me render ao intervalo dos séculos que o meu corpo abriu.






















Ma...
comeste um deus do deserto
com a boca do corpo?




"Sim. Mas a versão oficial é que Ele era alado e dócil como uma pomba, e me regou a língua com agua-ardente, quando me escolheu e violou"


E a versão verdadeira?


"desceu sobre mim do céu e da terra ao mesmo tempo como uma língua de fogo que me incendiou o espírito e transbordou o corpo. comeu-me de tal maneira divina
que a minha entrega rendida
restabeleceu nesse instante o poder da fêmea ancestral"


geraste um messias, um homem,
concebido sem te teres manchado, sem a mancha de sangue, imaculada, o que quer dizer que já não eras virgem.


"a versão oficial é de que imaculada ficou a alma,
Não deixei mancha nas ervas sim,
mas sobretudo falam de alma imaculada porque eu Era numa rapariga inocente, e o deus também estava inocente. o projecto não era gerar mais uma criatura, era gerar um salvador
de criaturas"


e a versão verdadeira?


"se algum significado para além dos rebanhos de cabras e ovelhas que os patriarcas possuem existe na virgindade para os donos das mulheres, posso-te dizer que foi
a partir desse dia que fiquei Virgem .


A foda da tua vida, portanto?


"Não, não foi a foda da minha vida, nem sequer a foda do século, nem mesmo a foda do milénio. Foi uma foda eterna.
Ainda hoje e sempre me venho, e choro, sem fim."


o que aconteceu?


"torturaram e mataram o meu filho, coroaram-me rainha de criaturas que não existem e de territórios etéreos fora de alcance, quiseram reproduzir-me em construções de pedra, e encenam dentro do símbolo de mim mesma sua mãe o seu suplício e tortura. diariamente. bebem o seu sangue e comem o seu corpo, num ritual grotesco que lhes promete a vida eterna.
foi o plano que arranjaram para anular a libertação das criaturas planeada pelo deus do deserto contra o império."

...


"e tu? sabes que poderias ser queimado em praça publica por me fazeres essas perguntas."


sim, eu sei. estou a arder por dentro à muito tempo.




















The definitions of metaphysics and the various concepts of the absolute leads to the discovery that philosophers agree in distinguishing two profoundly different ways of knowing a thing.

The first implies that we move round the object; the second that we enter into it.

The first knowledge may be said to stop at the relative; the second, in those cases where it is possible, to attain the absolute.**














Em 754, o imperador Constantino V
estipulou o culto obrigatório
de Maria
e proibiu a entrada
ao céu
de todo aquele
"que não reconheça
que a eterna e sagrada Virgem
é sincera e justamente a mãe de Deus,
superior a qualquer criatura visível ou invisível
e que com sincera fé não busque sua interseção
como alguém que confia em seu acesso a Deus".

São Anselmo
de Canterbury
(1033-1109)
descreveu a Maria com as mesmas palavras
com as que havia definido
a uma Deusa
da natureza *





Aquilo que pretendo afirmar aqui é que o acto de pensar não é algo de descomprometido, algo de descarnado, muito pelo contrário, o pensar pensa-se no meu corpo, na minha carne, com toda a inquietação, com toda a perturbação que isso possa significar. Ao pensar a questão do limite do pensar filosófico, permitirei, abrirei a possibilidade de o meu corpo se pensar em mim [...] ***









________________________________________________________

* http://www.rosanevolpatto.trd.br/deusamaria.html
** Henri Bergson: "An Introduction to Metaphysics"
*** Maria João Ceitil: "Pôr o corpo a pensar"
**** Teresa de Ávila "Vivo sin vivir en mi"

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"poderás ser excomungado e acusado de heresia e blasfémia..."


No domínio ecclesiástico não. Não pertenço à Igreja, nunca fui baptizado. Faço o caminho da floresta, sou uma "creature of the wind".

No domínio secular, existem atenuantes... o meu advogado poderá argumentar que sou um poeta possesso...em delírio... não poderão condenar-me a mais do que um tratamento re-educativo pelos ortopedistas do pensamento.

10 comments:

ana said...

(é curioso que não há muitos dias estive nesse mesmo site a ler este texto
http://www.rosanevolpatto.trd.br/O%20Retorno%20das%20Deusas.htm )

de qualquer forma nunca percebi como é que Deus após ter ordenado que Moisés escrevesse na pedra os mandamentos, entre os quais:
-Não desejar a mulher do próximo
-Não cobiçar as coisas alheias
se foi logo meter com uma mulher casada!
Ou será que estou a levantar um falso testemunho???

Anonymous said...

!fuck Xtmas

1.01 said...

ana: curioso de facto :)
obrigado pelo comentário, deste-me inspiração para a segunda parte da história
*

Miss X:
fuck it, indeed...
*

[A] said...

Lembras-te de falar na necessidade de "um certo activismo"?
Descobri que o "teu" Bergson sustenta a mesma ideia- eu de forma intuitiva ;), ele, convenhamos, de forma analítica-

“Só vejo um meio de saber onde ir: é colocar-se em marcha”.

Do mesmo texto ainda Espinosa:
"O ignorante, com efeito, além de ser agitado de muitas maneiras pelas causas exteriores e de nunca gozar do verdadeiro contentamento íntimo, vive, ainda, quase sem consciência de si mesmo, de Deus, das coisas e ao mesmo tempo que ele deixa de sofrer, deixa também de ser. Enquanto que, pelo contrário, o sábio, na medida que se considera como tal, dificilmente se perturba interiormente, mas, consciente de si mesmo, de Deus e das coisas, em virtude de uma certa necessidade eterna, nunca deixa de ser, mas goza sempre do verdadeiro contentamento interior."

Eu sou obviamente o ignorante :/

[A] said...

és tu que "poderás ser excomungado e acusado de heresia e blasfémia"??
o texto é teu?
Como tu dizes: brutal!





(e andei eu na catequese até aos 12 anos...)

Anonymous said...

Não me fodam que ainda sou pequenino...E gramo à brava do Natal
Da consoada, dos gerimus e das filhoses, da familia, do bolo rei, dos amigos, do bacalhau, de dar e receber, das iluminações alegóricas, dos feriados, da generalizada predisposição para uma maior tolerância...
Mos o melhor de tudo, é mesmo o faz-de-conta.
Vejo tanta coisa boa no Natal que, sinceramente, estou-me cagando para as coisas menos boas, para essas tenho muito mais tempo.
Não me fodam o Natal que isto já está tudo fodido de mais para meu gosto.
Um bom Natal para vocês...

~pi said...

,poeta delirante,

fico na fascinação inadiável da ingerência do outro

[ ou era ingestão... ?

lembrei-me das mulheres selvagens que viviam nas florestas

e amavam animais e eram

memórias das nossas memórias

arcas de luar

((as mulheres depois assassinadas pela sua perfeição natural

insuportada pela inquisição,

mulheres e homens nós,

precisamente agora

? insuportáveis implícititos grávidos inquisidores

sólo, "Sólo esperar la salida me causa dolor tan fiero, que muero porque no muero".



~

in_side said...

exegese) endereço s

[A] said...

resumindo,o contacto é sempre uma experiência interior.

Anonymous said...

http://www.youtube.com/watch?v=PECk9A-07Pw&feature=fvwe2