20080929

..."O vento bailava"...

Tão desleal era a potência da mais simples palavra sobre o mais vasto dos pensamentos. Na realidade o pensamento daquele homem era apenas vasto, o que não o tornava muito utilizável. No entanto parece que ele sentia uma curiosa repulsa em concretizá-lo, e até um pouco ofendido como se lhe fizessem uma proposta dúbia.



Mas como nas histórias em que o príncipe distraído toca por fatal acaso na única rosa proibida do jardim e estarrecido desencanta o jardim todo - ...incauteloso executara entre mil gestos inócuos algum acto infamiliar que involuntáriamente o transportara diante de algo maior. A lanterna esfumaçava um fio negro. As paredes hesitavam. O vento bailava à porta. E em torno dele soprava o vazio em que um homem se encontra quando vai criar. Desolado, ele provocara a grande solidão.
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texto: in "A Maçã no Escuro", C.L.

20080924


Scarred, your back was turned curled like an embryo. Take another face, you will be kissed again. I was cold as i mouthed the words and crawled across the mirror. I wait, await the next breath, your name like ice into my heart. A shallow grave, a monument to the ruined age. Everything as cold as life, can no-one save you?. Everything as cold as silence and you will never say a word.*


As Freud said, "you can choose between neurotic misery and common unhappiness", as if this choice was the greatest gift of human intelligence. As for me, I will go on falling in love like an Eros, like Dionysus. I just don't care if Bacchae or maenads rip my body apart, you can feed with my body your lust of blood and men, because my soul will reborn and reborn again, falling and falling in love again. Love killed my soul and scattered my mind several times and they always survived. I am not afraid of love, I accept death, I accept Life. The one who wants to be immortal, to be un-dead, can choose to run away, and control. We will all meet in the place where bones and flesh do not enter. That is the only thing we can be sure of.

If love is a disease, I then want to be diseased, I want my body to rotten in pathology, and I want to be washed away by an illness so severe that I can never be useful for anything else. If love is a disease, what is Life? A mortal disease sexually transmitted: that's what life is. We are all going to dye. In fact, in the immemorial ages of time it is as if we were always dead.
Yes, you can choose to live between the "common unhappiness and the emotional misery of the neurotic". And you know what you can do with your theories and your mind control, where you can stick them up…stick them in your living grave, like a cross. **











...And I made a promise to myself, of never forgetting those horrid lonely days, so that I never again loose from sight the precious value you, and the ones like you, have for me, and the infernal pains of not having you, You, your voice, your body, your whisper, your smell, by my side, every night. **







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textos:
* The Cure, "Cold".
** José Elias Nunes, in "Diários de Bordo da Perdição"

20080921

maçãs, roseiras e cicatrizes













...sem motivo nenhum, lutou erguendo a cabeça com certo brio.
É que alguma coisa branda e insidiosa se misturara a seu sangue, e ela se lembrou de como se falava de amor como de um veneno, e concordou submissa.

























Era alguma coisa adocicada e cheia de mal-estar.
Que ela, conivente, reconheceu com suavidade supliciada como uma mulher que apertando os dentes reconhece com altivez o primeiro sinal de que a criança vai nascer.

Reconheceu, pois, com alegria e impassível resignação, o ritual que se fazia nela. Então suspirou: era a gravidade pela qual ela esperara a vida inteira.


























Depois, como uma mulher que se torna desordenadamente activa em momentos críticos, imprimiu mais força na espiga crua...

...num segundo perdido entre milhares de outros na vastidão do campo, sujeita à lei da única célula que se fecunda entre as que fenecem, ela acabara de saber, como se escolhesse, que o amava.


























Por uma obscura necessidade de preservação, estava procurando recuperar no campo aquele minuto em que ela ousadamente aceitara amar o homem: procurava recuperar o minuto para destruí-lo.


























Mas, estonteada, talvez soubesse que também a necessidade de destruir o amor era o próprio amor porque amor é também luta contra amor, e se ela o soube é porque uma pessoa sabe.




























Procurou, desesperada e ofendida, aquele minuto que já agora nunca mais ela saberia se fora fatal a ponto de submetê-la - ou se nesse minuto ela própria fora tão extremamente livre que, numa gratuidade que já era pecado e que depois se pagava...









































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texto: "A Maçã no Escuro", C.L.
fotos: autor desconhecido. Modelo: Scar 13
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20080918

How I wish you were here



os olhos, a boca, o nariz, os ouvidos, o tacto.
cinco tentáculos. *






sair da pele
para o meio de um largo onde estão pessoas
falar um misto de línguas latinas do novo-mundo e grunhidos bárbaros germânicos

depois calar-me
e deixar-me apaziguar pelo som das vozes
enrolando-se nos próprios cabelos
[...]


falando tão de dentro
que se pode ver os seus ossos do ventre servindo-lhe de corpete

e as palavras um corpete para juntar o passado e o futuro



apago os meus passos,
com nevoeiro.

Nevoeiro de sangue,
fervido,
evaporado,
vaporizado.*











And did they get you to trade Your heroes for ghosts? For a lead role in a cage? We're just two lost souls Swimming in a fish bowl, Year after year, Running over the same old ground. What have we found? The same old fears...**


How I wish you were here




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Textos:
* José Elias Nunes; "Livro de Bordo da Perdição".
** Pink Floyd; "Wish you were here".

Fotos:
0.04
última foto: autor desconhecido, modelo: Kumi Monster

20080916

"Sermos personalizados e corajosos, ao mesmo tempo que somos pacientes e solidários"

queremos criar insegurança na equipa do Barcelona e fazer aquilo que fazemos em todos os jogos, sejam no Campeonato ou na Liga dos Campeões: tentar ganhar", observou, antes de explicar se o empate é, ou não, um resultado que interesse aos leões: "Empatar em Barcelona pode sempre ser bom. Mas, antes do encontro, não estamos acostumados a jogar para empatar. Antes, queremos ganhar a todos os adversários e em qualquer campo. Se, durante o encontro, não conseguirmos o principal objectivo, que são os três pontos, podemos tentar assegurar a conquista de um. Mas não vamos jogar aqui para o empate." Consciente do poderio do conjunto orientado por Guardiola, Bento deu a receita para hoje. "Temos de ser fiéis ao estilo que criámos ao longo do tempo. Sermos personalizados e corajosos, ao mesmo tempo que somos pacientes e solidários quando estivermos a defender", revelou, sem abdicar de lutar pelo domínio de, pelo menos, parte da partida: "É muito difícil chegar aqui e dominar durante 90 minutos, mas temos de saber controlar, até porque queremos que o Barcelona também não seja capaz de o fazer.*


O Sporting iniciou mal a participação na fase de grupos da Liga dos Campeões, ao perder esta noite, por 3-1, em Camp Nou, com o Barcelona. Na primeira parte, os leões foram, no mínimo, inofensivos, sendo completamente dominados pelos catalães, apenas tendo acordado na segunda parte. [...] Na segunda parte, os leões apareceram transfigurados, mais agressivos, mais atrevidos, passaram a jogar mais no meio-campo adversário, mas quando se pensava que as coisas se equilibrariam ou, pelo menos, se aproximariam do equilíbrio, o árbitro francês Laurent Duhamel “decidiu” inventar uma grande penalidade por suposta falta de Abel sobre Eto’o, que este acabaria por converter. Ainda assim, o Sporting continuou a acreditar que era possível trazer de Barcelona um resultado positivo, tentou jogar de igual para igual.[...] Nada está perdido para o Sporting, pois provavelmente não contaria com os três pontos que se jogaram em Camp Nou e há ainda muitas partidas a disputar.

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* Paulo Bento.

20080912


Levantar de rastos
Incapaz de enfrentar o dia e o corpo,
o peso do próprio corpo.
E voltar para a cama doente de luz,
até alcançar aquele estado de intoxicação por sono, como ópio, aquele estado em que o corpo deixa de pesar e deixa de doer,
e em que as ideias se tornam mais esbatidas e menos cruéis.
O veio negro, pastoso, que ensopa a cauda e as asas da minha existência há anos, há décadas, continua a brotar, e é cada vez mais denso. A ferida não sara, o ódio e a raiva não esmorecem, a culpa não diminui, pelo contrário.

Quem pressente estas coisas em mim, e pior, quem as vê, assusta-se. Pudera, também eu vivi, e vivo, em susto. Trabalho no meio do mar, vivo por cima de um vulcão adormecido. A falta de vento, ou o rumor surdo da terra ao longe, anunciam-me todas as manhãs catástrofes terríveis, e o crepúsculo de cada tarde embriaga-me de uma gratidão pasmada de condenado.

É que me está a sair da boca o meu avô, e os seus profundos suspiros resignados envoltos num sorriso estranho, que transbordam de uma alma inundada de misteriosa tristeza. É que não me sai da pele e da face a amargura alienada e profundamente melancólica do meu pai, e o ressentimento invencível contra a vida e o mundo. É que não me sai do sangue a violência súbita da minha avó contra os que estão próximos, como se os pudesse destruir e recriar mais perfeitos logo a seguir.
Escondo-os o melhor que posso, escondo-os até conseguir, sobretudo da minha amada.

Mas quem pressente estas coisas em mim, e pior, quem as vê, assusta-se. Pudera, também eu vivi, e vivo, em susto. Trabalho no meio do mar, vivo por cima de um vulcão adormecido. A falta de vento, ou o rumor surdo da terra ao longe, anunciam-me todas as manhãs catástrofes terríveis, e o crepúsculo de cada tarde embriaga-me de uma gratidão pasmada de condenado.

As criaturas profundas do Mar existem, eu vi-as, já me perseguíram. Assustam-me tanto, mas tenho de trabalhar por cima delas, conviver com elas todos os dias.

Amo perdidamente a Terra como ninguém, mas sei que a qualquer dia, a qualquer momento, ela me pode engolir e liquefazer como manteiga, nem por ódio nem por amor, só por ser assim.

E ter de aceitar a cada dia a morte eminente, desde que aprendi a pensar por palavras, destroça-me pois estou apaixonado pela Vida, e a dor do luto por Ela envolve-me todo como uma rede de aranha, todos os dias.

Queria então ser imortal, mas o pensamento ralha-me cada vez mais violentamente que não pode ser, o que me condena a ser uma criança injustamente contrariada no desejo mais importante, na própria possibilidade de existir mais um momento.
Como cada segundo é para mim um grão de areia a cair num relógio de vidro, tento abolir o tempo, o que me suga extrema energia, me vampiriza no pacto diabólico, e me deixa exausto ao fim de algum tempo;

e no final desse tempo Ele vem mais uma vez reclamar a minha alma
e devolver-me o relógio de vidro.
















Quem pressente estas coisas em mim, e pior, quem as vê, assusta-se. Pudera, também eu vivi, e vivo, em susto. Trabalho no meio do mar, vivo por cima de um vulcão adormecido. A falta de vento, ou o rumor surdo da terra ao longe, anunciam-me todas as manhãs catástrofes terríveis, e o crepúsculo de cada tarde embriaga-me de uma gratidão pasmada de condenado.

Se eu pudesse consolar e acalmar esse susto que causo, esse pânico e essa desilusão enojada com o existir que causo, habituar alguém a ele, como eu me habituei, deixaria de estar só. Ajudar alguém a resistir a ele, como eu resisto. Partilhar com alguém a embriaguez causada pela gratidão pasmada por mais um crepúsculo.

E a cada vez que consigo que alguém volte, se volte a aproximar depois da fuga e da auto-expulsão, fico menos só. Mas a inocência perdeu-se; e com a inocência perdida perde-se o presente, e fica-se eternamente condenado ao passado e ao futuro.
Se houvesse alguém que conseguísse pensar e sentir estas coisas e manter alguma inocência, e eu a encontrasse, eu deixaria de estar só.

E talvez então parasse de me sair da boca a misteriosa e resignada tristeza, e me parasse de sair dos poros da pele a amargura alienada e melancólica e o ressentimento invencível e o meu sangue se purificasse da violência súbita contra os que estão próximos.

E talvez então eu parasse de querer comer almas de pessoas, e parasse de querer ser devorado por elas para me salvar.
Tentei, e depois recusei, o álcool e as drogas como remédio e desculpa. As minha drogas químicas são o sono e o sexo.
Os meus licores são o odor dos poros da pele e o som das palavras e do silêncio dos outros.

Aprendi a derrocada dos sonhos e o humor dos pesadelos quando se cumprem. Substituí pesadelos a dormir por delírios acordado, e substituí os sonhos acordado pela intoxicação do sono profundo.

A fome levou-me de novo aos rebanhos; a esperança de ser devorado levou-me para o meio dos lobos.

Foi isto que sonhei durante a noite, e acordei de rastos, incapaz de suportar o peso da manhã, o peso do meu próprio corpo. E voltei para a cama doente de luz,
até alcançar aquele estado de intoxicação por sono, como ópio, aquele estado em que o corpo deixa de pesar e deixa de doer,
e em que as ideias de tornam mais esbatidas e menos cruéis. *



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* i
n "Diário de bordo da perdição". José Elias Nunes

20080909

This is our life.





Guilt was giving way
to pain. And pain seemed to bring them closer. My father had humbled dramatically. And what had always been a sort of curt arrogance, the kind of man who actually thought he could cancel Christmas, had given way to the vulnerability...


Instincts that seem to sense the threat of a loss so huge and irreparable that the mind balks at taking its measure - I begin to wonder if I do understand what Chris is saying any longer. ...in the forced reflection that comes with loss, indeed everything Chris is saying, has to be said. And I trust for him that everything he is doing has to be done. This is our life.*




*http://www.moviescriptplace.com/main/movie/907

20080906

life from the midst of nothingness



Our bodies are given life from the midst of nothingness.

Existing where there is nothing is the meaning of the phrase, "form is emptiness."

That all things are provided for by nothingness is the meaning of the phrase, "Emptiness is form."

One should not think that these are two separate things.

























a tua ausência dá-me forma. Somos o negativo um do outro















20080904

As bagas azuis



Não sei ao certo e no total a resposta para a pergunta "a quem é que isto interessa", e não sei ao certo e no total a quem é me dirijo, mas esta noite finalmente me enfiei numa sala de cinema suficientemente ampla, para ver o tal My Blueberry Nights. O Outono chegou, uma certa àrvore no Largo das Necessidades anunciou-o molhada e vermelha mesmo na noite sem lua.

Cada imagem é uma obra de arte, para ser soprada tal como uma mandala de areia e dar lugar à mandala seguinte, onde são colocados os diálogos banalmente soprados como o vento leste sopra um rebento de bambú, pelas mais banais estrelas de hollywood colocados como figuras vivas de semi-deuses, são imensos os tons de vermelho em grão,
tal qual a àrvore junto ao palácio.

Ele, sentindo-se perdido ficava no mesmo sítio para que o pudessem encontrar, para que aquelas com quem se havia e haveria de desencontrar o voltassem a encontrar. Ela fugiu pelas planícies continentais para poder voltar a si; não lhe disse a ele onde estava, por onde andava, ia-lhe escrevendo postais . Wong Kar-Wai tem uma devoção erótica que se revela um respeito espiritual por aquelas mulheres. O que ele consegue fazer da Rachel Weisz... A américa do sexo e da violência transforma-se por um passe de magia na américa da liberdade e da ternura. A arma nas nas mãos do polícia alcoólico é um instrumento de ternura excessiva. a não perder num écran gigante. Se eu pudesse escolher, Wong Kar criaria de novo o mundo.




Elizabeth: How do you say goodbye to someone you can't imagine living without? I didn't say goodbye. [pause]. I didn't say anything. I just walked away.





Jeremy: From my observations, sometimes it's better off not knowing, and other times there's no reason to be found.
Elizabeth: Everything has
a reason.