20070317

o gato que Ostara de cerejas
















271204
Cheguei da terra do sono.
Onde dormir é um imperativo categórico da razão prática.
[da terra do sono sedutor]
venham a mim animais sagrados. A minha cabeça caída na relva, a ganhar raízes entre as raízes das láminas de relva.
Venham ao meu sono, por favor entrem nesta Arca de Nóe, aos pares, e salvem-se assim do dilúvio, dos tsunamis, das idades do gelo, da extinção.

Entrem de mansinho para debaixo desta avalanche de sono onde a minha cabeça cortada está soterrada,
furando a neve com os vossos focinhos negros quentes e húmidos.
Venham aquecer o meu sono, dar cheiro a bicho selvagem ao meu sono, e lamber-me as feridas por sarar à muitos anos, hà decadas.

Venham emanar inocência e bestialidade puras
para dentro do meu sono. Venham trazer calor, pêlo e respiração pausada ao meu sonho,
as vossas crias pousadas no vosso ventre, a dormir de barriga para cima e patas dobradas para dentro,
a suspirar ocasionalmente.
As vossas presas; ratos, lebres, esquilos,insectos, pássaros, a dormir profundamente entre as patas das vossas crias, entregues serenamente ao destino.

...
Este inverno, como sempre, foi uma catástrofe calculada.
Fui apenas mais uma folha solta.
Dilacerado pelo vento.
À mercê dos elementos.
Enrolado pelo redemoinho da terra.
Acedi ao sol e resolvi despertar mais uma vez.
deixei-me encantar de novo pelo odor de Ostara...


Não foi difícil convencer-me.
Espero um beijo teu esta primavera.
Disfarçado no meio da malga de cerejas.








.

14 comments:

sonho said...

Homenagem ao SOL!!!!

Está a chegar o mais ambicionado dos equinócios...

Pelo sim, pelo não, já podemos ir fazendo a fotossíntese... virados para Meca...

Mas o polen... ai o polen...

:)

1.01 said...

Não há cidade que resista a uma tempestade de pólen,

mas uma tempestade de pólen não é capaz de destruir uma fortaleza voadora,
um castelo no ar.
---
Homenagem ao Sol, à Arvore da Vida e ao Green Man.
---

Não há meios homens pequenos que me consigam fazer odiar.

O meu ódio é grande. Guardo-o para coisas grandes.

:)

a.a5 said...

"...
A transfusão das imagens,
Fendido
ao meio dos olhos, Por onde penetra a agudeza
do mundo:
e me
transforma, Quem
enterra um diamante e não sabe
que o enterra
em si, E fosse: pela costura
elementar: uma pálpebra
por cima de um
aparelho da alucinação um
organismo do sonho,

Alguém que se deitasse
com um grito
dentro: e acordasse com esse grito
pela boca fora,
Que fosse
uma cana encontrada
no vento: quando é de alguém
que o vento se levanta,

E os dedos atassem
e desatassem o som
nos orifícios - música
ferramenta
a paixão,
Que fosse
de fôlego a fôlego, Qualidade,
da coisa que se nomeia,
E tudo me abala
- O nome a encher uma pessoa
como a luz enche o vento,
Ou a ferida enche a lembrança,
..."

:)

sonho said...

"
O Néctar do Amor

Um sábio falou aos assistentes sobre essas duas grandes potências da alma, que são o amor e o ódio. Num dado momento afirmou:
- Amor e ódio são duas grandes forças, são energia e têm muito poder, mas no amor reside uma grande força construtiva; no ódio, uma grande força destrutiva. Mas há uma diferença no seu poder.
Os assistentes perguntaram qual a diferença e o sábio retorquiu:
- O amor é como o perfume; o ódio é como o veneno. Ambos têm uma grande força, mas há uma grande diferença no seu poder.
Todos estavam ansiosos por saber qual a diferença.
- O amor é balsâmico - acrescentou o sábio-, e o ódio é tóxico, mas há uma grande diferença entre o poder de cada um deles.
Os ouvintes começavam a impacientar-se e finalmente exigiram uma explicação. O sábio disse:
- É bem simples. O amor tem maior alcance e nada o consegue travar. O ódio é muito poderoso, sim, mas pode ser interrompido. O ódio é veneno, mas quando o veneno está bem fechado num recipiente, não consegue fazer mal nenhum. O amor é perfume e, mesmo que esteja bem fechado no seu frasquinho, sente-se o seu aroma. Ninguém consegue limitar o amor."

:)



:)



:)

1.01 said...

a ferida enche a lembrança, a lembranca enche a ferida.

a.a5: tao bom. quem escreveu isso?

Conheces Vasco Gato? "Lucifer", edicoes Alexandria (muito raro) encontras, se encontrares, no meu amigo Nuno Franco, alfarrabista, Rua do seculo, mesmo ao pe da esquina com a Calcada do Combro.

NARNIA said...

Avistamos coqueiros, animais e insectos reluzentes como se vestissem armaduras, a angustia deles era coroada com lilases. Do poente vinham macacos profetas, trovoes ecoam no solo abrindo as escotilhas da Terra.


BJS

a.a5 said...

É lindo... do Herberto Helder!

"Postei" em dupla homenagem à tua tempestade.


Abraço.

:)

1.01 said...

Sonho:

concordo muito com a tua história.

Acerca do ódio: um mineiro inglês disse que nunca perdoaria a Margaret Tatcher porque o tinha ensinado a odiar.

Fiquei deveras impressionado com aquilo e tentei lembrar-me de quem me tinha ensinado a odiar. Foi hà muito tempo, eu sei quem foi, foram as pessoas mais importantes da minha infância...

Desde que entendi isso eu estou-lhes a perdoar, a cada dia, a cada dia viro-me ao contrário para lhes perdoar. E me perdoar a mim mesmo por os odiar, os ter odiado durante tanto tempo.

E guardo o meu ódio, aquele veneno terrível, para os predadores da vida e da beleza.

Quem me "ensinou" a amar, mesmo, além da natureza e dos bichos, para além dos livros mais insuspeitos, foi uma pessoa, uma mulher.

Quem me está a ensinar a amar, a ajudar a aprender.

E quando se começa, é dificil parar. Quando esse perfume se espalha...

Que nunca se misturem os conteúdos dos dois frascos.
Nectar com veneno é uma mistela intragável e muito perigosa.


Mas para os poder separar em frascos, primeiro é preciso separá-los por operações alquìmicas complicadíssimas e muito trabalhosas,

separá-los e destilá-los a partir da matéria bruta dos desejos, - uma massa de nervos informe onde ódio, amor, medo, dor e prazer se encontram enrodilhados como embriões.

sonho said...

fiquei a olhar para o que agora escreveste, com um olhar à transparência, enquanto um turbilhão de imagens, da vida, poemas, sonhos, se misturavam e me levavam para longe...

isso que escreveste é a vida, a vida descrita de uma forma tão brutal mas tão simples tão bela

a minha eterna questão

atravessar o labirinto

abrir a janela


:) mesmo assim

Anonymous said...

Temos o degelo
A sublimação
e
A alquimia
Bem vistas as coisas há muito espaço e muito tempo
Muita vida


Noticias frescas daqui da terra:
Parece que as alheiras de Mirandela andam a provocar comichão aí a uns vizinhos.
Porra, eu que grama à brava de alheiras.

1.01 said...

Sonho:

"Into The Labyrinth" (1993)
Dead Can Dance

-Yulunga (Sprit Dance)
-Ariadne
-Towards The Within
-Tell Me About The Forest (You Once -Called Home)
-The Spider's Stratagem
-How Fortunate The Man With None

"Little brother":
Já estava em pleno vôo quando as tuas alheiras me vieram acordar em Trás-os-montes!
Quem bom acordar em trás-os-montes.
E me lembrar dos cristãos-novos que inventaram as alheiras, ao que parece.

Dá-me para isto quando a primeira lua cheia a seguir ao equinócio da primavera se aproxima.

abraços!

Frioleiras said...

a primavera raz as cerejas...
... cerejas,
o fruto
mais belo,
do mundo...
é um encanto,
qd aparecem ,
um encanto...
a primavera, tão rénua,
em breve se desfaz,
rebenta.
no calor
agressivo
do
verão ...

1.01 said...

Ola! long time no see :)
Eu estou indeciso entre as cerejas e as melancias como o fruto mais bonito do mundo...

E' tao bonito ver crescer as melancias, e depois abri-las e ver que esta uma cereja gigante la dentro.

"the watermelons are tasting so sweet this year, it's got to be a good year, it's got to be our year"

http://perso.orange.fr/vivonzeureux/lewisfurey/lewisalbum.html#lovecomes

Maria Ostra said...

Venham elas - as cerejas...umas atrás das outras...como as palavras(?) :)