O homem que Ostara de palavras. As pessoas que nos dão vida.

"Epá, foi mesmo do baril ter estado contigo naquela ditosa noite da re-união das tropas e do reapontar dos torpedos! Tás em grande ó altíssimo! Isto de passar a vida a acender lamparinas nas cavernas abismais da congénita cegueira que nos separa da verdade, e da vida, parece fazer mesmo bem à ialma, sim senhor! As forças do alto estão contigo!

Envio-te só agora os ex-critos, que de facto, uns meses depois me dão ideia de ter que passar não pelos ofícios da costureira mas sobretudo pelo machado do lenhador ou o facalhão do talhante… seja como for envio-te este primeiro rascunho, não para que percas muito tempo nele, mas para que me digas, à primeira vista, onde achas mais premente fazer cair a lâmina. A parte do instrumento, da análise estatística e dos resultados, é que talvez pudesse ficar mais a teu cargo já que reconhece em ti a honrosa paternidade!

Cravado no madeiro da separação e do desamparo, coroado pelos espinhos da castração e aceitando sem pestanejar as agruras da condição, com os olhos no alto, deixando-se sonhar pela divina rêverie (introjectando pensamentos oníricos do paraíso) elaborou as trevas da finitude, e foi salvo! (palavra do delírio chagasiano, yá-mén!)"

Eu sempre disse que este gajo amava as palavras e por isso é especial. Quem ama as palavras como ama coisas vivas é especial, é humano, por mais fraquezas e defeitos que tenha.

Palavras e música, são as coisas mais importantes da condição humana. O resto são bifes, fibras, e fluidos orgânicos, nada mais que isso.
As pessoas que mais valorizo e que me deram as melhores coisas na vida foram as pessoas que me deram palavras e música especiais.
Lembro-me da primeira vez que ouvi mexer o embrião desta ideia: foi quando CAD disse, em pleno Caos e Metapsicologia, (com aquela banda de chill out psicadélico em som de fundo ao vivo onde tu camarada NO tocavas baixo) "Beethoven ouve-se com o corpo todo".

E o Joni que me mostrou Placebo, Mogwai, God Speed You Black Emperor, Cat Power, quando eu pensava que já não havia nada de novo debaixo do sol.
Tu que me deste A Perfect Circle, Corvus Corax, Luar na Lubre, e me fizeste redescobrir Depeche Mode na carne e nas circunvalações lunares do cérebro. Tu que me mostraste Anthony and the Johnsons, Bohren und der club of Gore. Tu que me fizeste revisitar a autoestrada 61 de Bob Dylan. Tu que me ensinaste a ouvir Bossa Nova no teu Renault 5 quando estavas com coração destroçado e um sorriso grande que me fez perceber que a Bossa ampara o coração e ensina o amor quando nada mais consegue. E tu meu grande amigo desencontrado, que me fizeste pegar numa guitarra pela primeira vez, e me mostraste os Xutos, os Mão Morta, os Violent Femmes, os Joy Division, Os Velvet Underground, Tom Waits. E tu aí, que me mostraste aquela versão deliciosa do Paradise City... e tu, e tu, e tu... Todos pessoas que estão na minha pele, porque ela se acorda quando me lembro de vós. Tu que estás debaixo da minha pele em tinta preta, sinto tanto a tua falta em cada hora que passa...mas tenho os livros que me emprestaste e que leio como se passeasse pelo teu espírito, pelos planaltos do teu corpo, conduzindo a gôndola em riste numa Veneza de lágrimas, à descoberta de zonas de caça de luz, pelo cheiro, como um animal selvagem a descobrir uma cidade pela primeira vez.

Eu meço as pessoas pelas palavras e a música que elas me dão. Que elas me passam clandestinamente, como dealers de alívio e de gozo sublime. É o melhor indicador dao valor das pessoas, como tenho verificado durante estas 3 decadas e meia de errância pela vida.

O resto, o resto é entropia. Ruído, macaquice, pura estupidez, pequenice. O resto não vale a pena.

We've come a long long way together,
Through the hard times and the good,
I have to celebrate you baby,
I have to praise you like I should

http://www.youtube.com/watch?v=tFeoCLHi5e4


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